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segunda-feira, setembro 19, 2005

Anos dourados da internet?

A mídia corporativa está perdendo um pouco de seu poder com a explosão de popularidade dos blogs. A credibilidade e a venda dos jornais diminui sistematicamente, como apontam diversas pesquisas ao redor do mundo. Muitos analistas de mídia sinalizam que mudanças grandes estão por vir nos próximos anos. A participação da população na produção de conteúdo e notícias em blogs e websites é tida como um fenômeno que pode favorecer a democracia e descentralizar o poder.

Mas será que estamos realmente em direção a este caminho? As grandes corporações de mídia e os governos não vão fazer nada para obstruir esse movimento que vem dando poder ao povo através da web?

Rafael Behr publicou no THE OBSERVER um artigo com uma análise um tanto quanto pessimista daquilo que está por vir nos próximos anos de internet.

Preparei abaixo uma versão reduzida do artigo, traduzida para o português. O original, completo em inglês, pode ser encontrado neste link.

ACESSO NEGADO

Quinze anos depois de Tim Berners-Lee criar uma maneira de ligar documentos entre si, constituindo uma grande teia – a web, vivemos os anos dourados da internet, um tempo de anarquia gloriosa onde a informação é livre para todos e possibilita que ricos e pobres bloguem suas opiniões para o mundo.

Atualmente os blogs ocupam um papel especial, representam a segunda geração de cidadãos na web. A primeira geração foi a dos geeks pioneiros que desenvolveram seus próprios sites nos anos 90. Diferentemente dos percussores, esta segunda onda não precisa de um know-how técnico nem conhecer linguagens de programação para publicar suas idéias na web. Utilizam um espaço digital pré-fabricado com software livre bastante fácil de operar.

Um novo blog é criado praticamente a cada 2 segundos. O número total é difícil de estimar por não haver consenso na sua definição, mas 15 milhões de blogs é um número aceitável. A cada dia aumenta o número de pessoas que deixam suas impressões, opiniões, críticas e conhecimentos na grande rede.

Numa época onde o capitalismo triunfa e o sucesso geralmente é medido pela acumulação de riquezas, é difícil conceber uma sociedade paralela estabelecida e auto-governada em princípios de confiança e posses em comum. Mas esta sociedade existe. A maior agregação de experiências humanas e conhecimentos já criados pertencem a todos e está disponível livremente.

Mas por quanto tempo? Uma estranha coalizão está lutando contra a nova cultura da liberdade digital. Governos incapazes de resistir a tecnologias que podem rastrear todos os nossos movimentos; corporações famintas pela audiência de 2 bilhões de olhos focados nas telas dos computadores; e os spammers entupindo a rede com lixo, invadindo computadores e espalhando mentiras.

‘A internet, primeira mídia muitos-para-muitos, tinha potencial para nos libertar da tirania da mídia centralizada e do consumismo. Eles pregam que somos apenas receptores daquilo que as grandes empresas, incluindo a grande mídia, desejam que compremos`, escreve Dan Gilmor, um escritor de San Francisco, em “We The Media: Grassroots Journalism by the People for the People”. ‘Mas o combate começou. Em todo lugar que olhamos, as forças de centralização estão encontrando formas de limitar os avanços que fizemos’.

Gilmor é um cronista da Citizem Media, movimento para transformar notícias e entretenimento de um caminho de mão única (nós produzimos, você consome) em uma conversação (todos fazemos, todos trocamos). Alguns exemplos iniciais são a wikipedia - a enciclopédia colaborativa, e o jornal Ohmynews, que é produzido por seus próprios leitores.

Mas o movimento é maior do que qualquer site. Grande o suficiente para botar medo nos empresários e políticos. Os governos foram lentos em apreciar as mudanças sociais causados pela tecnologia, mas rápidos para perceber sua potencial aplicação para exercer controle e invasão de privacidade.

Blogueiros do mundo todo já foram advertidos por regimes repressivos. A China sucessivamente restringe o acesso da internet e coloca limites no que milhões de usuários podem acessar. A tecnologia que possibilita aos governantes vigiar e-mails e rastrear qualquer clique do mouse na internet é muito sedutora para ser ignorada. É quase certo que a vigilância da web fará parte da legislação inglesa anti-terror ainda este ano.

Há também a grande mídia e corporações de entretenimento dos EUA. Eles estão irritados porque a audiência deles está sendo capturada por um exército de internautas editores. A grande mídia detém os direitos autorais de grande parte da cultura popular em língua inglesa, estão procurando tornar as leis de copyright ainda mais duras, alimentando um regime de repressão intelectual que barra a criatividade com ameaças de processos.

Mas para muitos a luta com a grande mídia e estúdios de Hollywood não é o maior problema. Vândalos, fraudadores e pervertidos também são um risco para a internet livre e democrática. Muitas famílias temem o que seus filhos podem encontrar na grande rede, como por exemplo, pornografia, pedofilia e propagação de idéias terroristas. Todas as experiências humanas estão na internet, incluindo o lado ruim. E é difícil de policiar a web, os criminosos se beneficiam de uma rede global sem claros limites da lei. Se um site ilegal é fechado, no outro dia ele ressurge em Moscow.

Mas deve-se partir da teoria de que a maioria das pessoas não é criminosa. Assim como o mundo, a grande rede não é de todo ruim.

Acontece que alguns proprietários da grande mídia estão tentando tirar proveito do lado sombrio da web para espalhar medo em relação ao conteúdo que não é publicado por empresas conhecidas. Com isso tentam guiar as pessoas para jardins fechados de conteúdo seguro (pago através de assinaturas), adequado para os padrões familiares, livres de criminosos e de material ofensivo e ilegal.

A grande meta é direcionar a energia que os blogueiros estão utilizando para criar sua própria mídia em um consumo de conteúdo pago, produzido pelas grandes corporações. A grande mídia quer sufocar a atuação das pessoas na web. A forma para alcançar isso é monopolizando os direitos autorais do material e ferramentas que os usuários costumam utilizar.

Noam Chomsky, lingüista e comentarista de mídia, concorda: ‘As grandes corporações estão concentrando muitos esforços para modelar a internet de forma que ela praticamente seja usada apenas para comércio e diversão. Aqueles que desejam utiliza-la para informação, organização política e outras atividades, passarão por tempos difíceis’.

Para ser justa ao capitalismo, a motivação pelo lucro criou ondas de inovação e crescimento. Quando o Google começou, prometeu ‘não fazer nenhum mal (do no evil)’. Quis organizar a informação do mundo e foi bom nisso. Todos tomaram conhecimento desta inovação maravilhosa. O Google nunca teve que anunciar.

Mas agora há um sentimento crescente de que o Google (com valor estimado em $50bn) cruzou a linha. O poder que tem sobre a maneira em que as pessoas fazem procuras na web, e os dados que pode juntar sobre cada usuário individual, estão começando a parecer menos com um projeto para organizar a informação do mundo e mais com uma maneira de possuí-la. Os geeks perderam seu encanto com o Google, dizem que ele se tornou mal (Google, they say, has turned evil).

A nossa geração é a última que lembrará do mundo analógico. Para a próxima geração de nativos digitais, a web será uma máquina de vendas.

Escuto os gurus da web, pessoas que pregam a liberdade cheias de entusiasmo com a nova sociedade digital do futuro. Temo que eles estejam errados. Mas este excesso de idealismo apenas prova que os anos dourados da internet estão, de fato, acontecendo neste exato momento.

1 Comments:

  • Para toda segurança há (pelo menos) um furo...

    A pretensão capitalista de cercerar o pensamento humano é real (vide 1984), mas... quando se comprime o pensamento, ele não encolhe, ele EXPLODE!

    By Anonymous Anônimo, at 10:01 PM  

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